A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) elegeu recentemente seu novo presidente em uma eleição com candidatura única. A troca na presidência ocorreu após a saída judicialmente determinada de Ednaldo Rodrigues, o que já levanta suspeitas de um jogo de cartas marcadas. Afinal, o sistema que elegeu o novo dirigente é o mesmo que há décadas centraliza o poder em torno das federações estaduais e clubes grandes — um ciclo que se renova, mas que dificilmente se rompe.
Em um discurso longo e recheado de promessas, o novo presidente exaltou palavras como renovação, diálogo, compromisso e transparência. Mas será que essas palavras se converterão em ações concretas? Ou estaríamos diante de mais um caso da típica retórica da política brasileira, onde se promete picanha e se entrega abóbora?
A promessa de uma “nova CBF”: discurso ou prática?
Em seu primeiro pronunciamento oficial, o novo mandatário destacou que sua gestão será marcada por:
- Reorganização do calendário do futebol brasileiro, com a redução dos campeonatos estaduais para no máximo 11 datas;
- Criação de um grupo de trabalho para o Fair Play financeiro, com participação de clubes e especialistas;
- Reestruturação e valorização da arbitragem, com presença de representantes dos clubes na Comissão Nacional de Arbitragem;
- Apoio à criação de uma Liga Nacional de clubes, promessa feita por diversas gestões anteriores e nunca concretizada;
- Combate ao racismo e à discriminação, com o retorno de projetos sociais como a Taça Indígena;
- Compromissos com sustentabilidade e educação ambiental.
À primeira vista, a fala é louvável e sinaliza atenção a pontos importantes. O problema é que promessas semelhantes já foram feitas por ex-presidentes como Ricardo Teixeira, José Maria Marin, Marco Polo Del Nero e o próprio Ednaldo Rodrigues — todos alvos de críticas, processos e escândalos.
Eleições na CBF: democráticas ou encenadas?
Um fator que causa desconforto entre torcedores e analistas é a forma como o novo presidente foi eleito: candidatura única em um sistema que concede poder de voto desproporcional às federações estaduais — muitas delas sem representatividade real no futebol profissional.
Esse arranjo político permite que dirigentes perpetuem alianças e garantam apoio mútuo, dificultando a entrada de nomes realmente independentes ou reformistas. Ou seja, mesmo com discursos progressistas, o sistema que elegeu o novo presidente permanece o mesmo: opaco, pouco participativo e altamente centralizado.
As promessas se sustentam? Especialistas apontam ceticismo
Embora o presidente tenha dito que “nenhuma transformação ocorre da noite para o dia”, especialistas veem com ceticismo a possibilidade de mudanças profundas sem uma verdadeira reforma estatutária.
O jornalista Juca Kfouri já escreveu: “A CBF não será limpa enquanto as federações mandarem nela.” Nomes como Walter Feldman e ex-atletas compartilham essa opinião e frequentemente denunciam que a entidade ignora as reais demandas do futebol de base, do futebol feminino e da formação técnica de novos talentos.
Além disso, a resistência à criação da Liga Brasileira de Clubes, que traria independência à organização dos campeonatos nacionais, sempre partiu da própria CBF, que teme perder poder e recursos. Será diferente agora?
O futebol brasileiro precisa de mais que palavras bonitas
A verdade é simples: o futebol brasileiro não carece de promessas — carece de credibilidade, estrutura e profissionalismo.
Discutir calendário, fair play financeiro e combate ao racismo é necessário, mas não adianta se a base da pirâmide continua contaminada por interesses políticos, fisiologismo e ausência de transparência.
Enquanto dirigentes tratarem o futebol como ferramenta de barganha política — e não como um patrimônio nacional com enorme potencial econômico e social — eles continuarão discursando sobre mudanças enquanto perpetuam os mesmos vícios de sempre.
Conclusão: sinal amarelo aceso
O novo presidente da CBF terá uma grande oportunidade nas mãos — talvez única. Se conseguir cumprir parte do que prometeu, já será um avanço. No entanto, sua eleição por unanimidade em uma candidatura única, sustentada por federações sem representatividade esportiva real, acende um sinal amarelo.
A torcida, os atletas, os técnicos e os profissionais do futebol esperam mais que palavras: esperam ações concretas e corajosas. Até lá, seguimos observando, fiscalizando e cobrando — pois o futebol é muito grande para continuar sendo comandado por tão poucos.